Artigos 790-B, § 4º e 791-A, § 4º da Reforma Trabalhista
Artigos 790-B, § 4º e 791-A, § 4º da Reforma Trabalhista
Retenção de honorários periciais e contábeis dos créditos dos empregados: não interessa sequer aos favorecidos
Rosiul de Freitas Azambuja
As normas lançadas no título determinam que honorários advocatícios e periciais sejam retidos dos valores obtidos pelos empregados nas ações trabalhistas, mesmo que sejam beneficiários da justiça gratuita.
Não tenho dúvidas de que estes dispositivos legais são inconstitucionais, pois o disposto no artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal diz que o Estado prestará assistência judiciária integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. Ora, honorários periciais e advocatícios podem ser retidos dos créditos de empregados com altos salários, mas não daqueles que comprovem insuficiência de recursos.
Mas, a situação estabelecida com a Reforma Trabalhista é muito pior, ainda. Ora, a quase totalidade das ações trabalhistas são de desempregados, pois não há estabilidade no emprego e o empregado somente recorre à Justiça do Trabalho, quando é demitido. Assim, o autor da ação, mesmo desempregado e sem recursos para a sua sobrevivência, sofrerá retenção de seus créditos. Indo, mais adiante, mesmo que o empregado já tenha obtido novo emprego, tem que ser amplamente debatido o valor da remuneração que justifique a não concessão do benefício da justiça gratuita, pois ele tem família e acaba pagando pela saúde, educação e segurança com o seu salário, obrigações do Estado que não são cumpridas por ele.
Os artigos 790-B, parágrafo quarto e 791-A, parágrafo quarto da lei 13.467/17 inibem o acesso à Justiça daqueles que mais precisam. Curiosamente, falamos, hoje, em democracia, mas inibir o acesso dos menos favorecidos à Justiça não combina com esta palavra. É flagrante a diminuição do número de ações trabalhistas, com o advento da nova legislação.
Tenho conversado com peritos, e, advogados de empregados e de empresas, desde o início da vigência da Reforma Trabalhista, e a maioria deles pretende que os dispositivos que criaram tais regras sejam declarados inconstitucionais pelo STF.
Mas, como peritos e advogados que supostamente são favorecidos com a cobrança de seus honorários de pessoas pobres não concordam com tais artigos oriundos da Reforma Trabalhista?
A resposta é simples. Na Justiça do Trabalho, os advogados ao longo de várias décadas, ajustam com os empregados os honorários contratuais, o que sempre funcionou muito bem, no caso daqueles que defendem os interesses dos empregados. Inclusive, em muitos destes contratos, também, é contratado um percentual para atender o perito contábil que trabalha para o escritório, pois o cálculo trabalhista é bastante complexo. Já, os advogados de empresas, normalmente, estabelecem seus contratos de acordo com o número de demandas enfrentadas por seus clientes, e, também, estabelecem valores para o perito contador. Portanto, todos eram remunerados, e bem, pelo seu trabalho. Antes de ingressar na magistratura, atuei, por quase dez anos, como advogado na Justiça do Trabalho tendo, portanto, vivenciado as contratações entre clientes e escritórios de advocacia.
Com a redução drástica do número de ações gerada pela possibilidade de retenção de créditos de trabalhadores pobres para pagamento de honorários advocatícios e periciais perdem os advogados e os peritos e a sociedade, como um todo.
Sabe-se que os escritórios de advocacia e de contabilidade estão diminuindo seus quadros, ou seja, passamos a ter advogados e contadores sem trabalho o que implica num outro problema social. Podem conseguir os advogados, dependendo do entendimento de que a regra da retenção de créditos é válida, por alguns juízes, dentre os quais não me incluo, cobrar honorários sucumbenciais e periciais, mas perderão muita arrecadação, em virtude da enorme diminuição de processos, pois os empregados estão com receio de ingressar com ações na Justiça do Trabalho.
Nossos filhos que cursam faculdades e que podem ter oportunidade de trabalho junto à Justiça Laboral como, como por exemplo, Direito, Contabilidade, Engenharia e Medicina, terão muito menos oportunidades de trabalho e emprego. Saliento que na Justiça do Trabalho são realizadas perícias por contadores, engenheiros, médicos, e, num menor número, por outros profissionais.
É bom frisar, ainda, que tanto na Justiça do Trabalho, como na Justiça Comum, não se ingressa para cobrar apenas o direito líquido e certo, mas, também, aquele direito que é controvertido e que é discutido no Tribunais, por longos anos, alternando para uma tese, ou, outra. A Justiça existe para dirimir conflitos e o acesso para o pobre de forma gratuita está consagrado na Constituição de 1988.
Pode-se pretender sustentar que o artigo 529, do Novo Código de Processo Civil, estabelece a possibilidade de retenção de salário em folha de pagamento para pagamento de prestação alimentícia, o que alcança os honorários sucumbenciais do advogado, mas não é razoável que isso seja feito no tocante aos honorários advocatícios quando o trabalhador receba um baixo salário, o que acontece com a maioria da população brasileira. Inclusive, também, no Novo Código de Processo Civil, no artigo 833, parágrafo segundo, está prevista a possibilidade de penhora do que exceder a 50 salários mínimos mensais, o que não me oponho, logicamente, mas certo é que não é justo e constitucional reter valores de pessoas que ganham salários baixíssimos para atender honorários advocatícios e periciais.
Portanto, os artigos 790-B, parágrafo quarto e 791-A, parágrafo quarto da lei 13.467/17 são regramentos que geram insegurança jurídica e que não interessam à maioria dos beneficiários, advogados e peritos, e também inibem o acesso à Justiça dos trabalhadores de baixa renda que são os verdadeiros usuários da Justiça do Trabalho.
Espero que o STF declare a inconstitucionalidade dos dispositivos legais apontados no título para que o acesso à Justiça do Trabalho seja gratuito para aqueles que comprovarem a insuficiência de recursos, conforme previsto no artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal de 1988.
Juiz do Trabalho Titular da 3ª Vara do Trabalho de São Leopoldo e diretor da AMATRA IV