Notícias

Gauchismo e Ideologia, por Rui Ferreira dos Santos, juiz do Trabalho

 

 

 

 Peço licença aos senhores

 Deste causo diferente

 E que afeta muita gente

 Desde o campo à cidade

 E a tal da sociedade

 Que envolve o CTG

 Vou lhes dizer por que

 É celeuma de verdade

 

 O Rio Grande vive há muito

 Envolto num só mitismo

 Surge no primeiro batismo

 É o orgulho rio-grandense

 Que a mais ninguém pertence

 De ter nascido gaucho

 Ser campeiro ou não é um luxo

 Outro destino nem se pense

  Peço licença aos senhores

 Deste causo diferente

 E que afeta muita gente

 Desde o campo à cidade

 E a tal da sociedade

 Que envolve o CTG

 Vou lhes dizer por que

 É celeuma de verdade

 

 O Rio Grande vive há muito

 Envolto num só mitismo

 Surge no primeiro batismo

 É o orgulho rio-grandense

 Que a mais ninguém pertence

 De ter nascido gaucho

 Ser campeiro ou não é um luxo

 Outro destino nem se pense

 

 Mas a origem desse campeiro

 Liberto, montado num flete

 Há muito não mais reflete

 Tempos que inexistia fronteira

 Desde que alambrados e porteira

 Se ergueram nas sesmarias

 E aquele teatino hoje em dia

 Em bretes forma fileira

 

 Com a chegada dos sesmeiros

 Vieram também alambrados

 Garantindo ao nosso Estado

 Povoamento e *segurança*

 Só não colocaram na balança

 A gratuidade desse ato

 Ninguém fez sequer um relato

 Do *liberto* sem esperança

 

 Era o início de nova era

 Já superada na Europa

 E formavam-se novas tropas

 Tanto de homens e cavalos

 *“Sem nunca terem regalos”*

 Eram os servos da gleba

 Em defesa da terra sem trégua

 Sem jamais terem estalo[2]

 

 Era peleia permanente

 Com correntinos e castelhanos

 Porque queriam *los hermanos*

 Tomar conta desta pampa

 E o gaúcho com a estampa

 E a ‘*proteção’* do seu *senhor*

 Fez-se peão e peleador

 Sem ter leite gordo na guampa

 

 E o que restou ao campeiro

 Que de campo nada tinha?

 Teve que andar na linha

 Dos largos campos sesmeiros

 Ora como soldado e campeiro

 Ora largado em corredores

 Sem flete e sem outros pendores

 Só com o calor dos braseiros

 

 Essa a origem do estancieiro

 Que na sua grande maioria

 Da elite militar em quantia

 Ou então bem afortunados

 Lusitanos e de outros estados

 Latifundiários e sesmeiros

 Riscaram o Rio Grande inteiro

 Inventando os alambrados

 

 E criou-se uma hierarquia

 Que hoje ainda persiste

 No campo ou na cidade existe

 O patrão chefe da estância

 O industrial, mesma importância

 E o peão agora operário

 Mesma sina, outro cenário

 Não mudou a tal da ganância

 

 E a ideologia do gauchismo?

 Eis a sutileza do tema

 Subentendido no esquema

 Dessa hierarquia nefasta

 Que o peão nunca disse basta

 E sequer se deu conta

 Da engrenagem que monta

 Nessa sociedade que o afasta

 

 É tão sutil esse esquema

 Da exploração do campeiro

 Que o comandante-estancieiro

 Com base nas próprias teorias

 Fe-lo com tal fidalguia

 De ser campeiro e liberto

 Mas bem vigiado de perto

 Expropriando a mais-valia

 

 Pobre do peão de estância

 Que vive nessa ilusão

 Embretado no galpão

 Entre versos e prosa

 Não vendo que a própria tosa

 Quem o faz é o patrão

 Que nunca lhe dá vazão

 Isso que é amarra vistosa

 

 Tudo isso veio a lume

 Com o Partenon Literário

 Porto Alegre Apolinário

 Deu o primeiro grito

 E por não haver conflito

 Com o pensamento da elite

 Fez-se então um convite

 Na criação desse mito.

 

 Depois vieram outros senhores

 Uns sequer estancieiros

 Talvez simples changueiros

 Da classe dominante

 Criou-se o primeiro levante

 Dessa concepção de mundo

 A dominação, pano de fundo

 E o CTG, vitrina e garante.

 

 Transportou-se aqueles valores

 Perpetuados na estância

 De honra, paz e constância

 Para os centros de tradição

 Com as amarras do patrão

 E a mesma disciplina

 Onde a hierarquia predomina

 Sem aprofundar a questão

 

 Não estou renegando meu pago

 Que até de pátria chamamos

 Mas é preciso que tenhamos

 Um naco de consciência

 Que aqui em nossa querência

 Não há libertos e sim amarras

 Que também atinge as guitarras

 Quando não a própria existência

 

 E a arte, o que é da arte?

 Essa deusa sem fronteiras

 Que surge em milongas e vaneiras

 Mas se expressa de outras formas

 Qual potro sem cabresto ou normas

 É um manancial indomável

 Que verte abundante e adorável

 Em multifacetadas formas

 

 E por aqui fica o meu grito

 Que na verdade é um eco

 De outros valores liberto

 Trazidos por tauras cantores

 Poetas e historiadores

 A quem sigo a mesma trilha

 Do contraponto e da partilha

 Para espraiar outros valores

 

 Rui Ferreira dos Santos

 Juiz do Trabalho

 

 

 

 

Compartilhamento