Notícias

Por que os juízes reclamam se ganham tão bem?

Esqueçam a toga e o martelo. Esqueçam o poder de decidir. Por traz desta imagem, o juiz é um trabalhador. Possui família, contas e se sujeita a todas as demais alegrias e incômodos da vida cotidiana. Agora, coloque-se no lugar dele e imagine se, nos últimos anos, a inflação tivesse corroído 25% do valor do seu salário. Ou seja, se você tivesse perdido ¼ daquilo que recebe mensalmente, mantidas (e aumentadas) todas as suas demais contas e obrigações. É isso que ocorreu com os juízes.

Pode parecer jogo de palavras, mas os juízes não querem “aumento”. Querem, apenas, que o salário volte a valer o que valia há cinco anos. Um direito simples, que todas as categorias profissionais organizadas conseguem ver respeitado nas suas datas-bases.

Os juízes querem, além disso, um pouco de segurança. Saber que, quando dão a sentença contra uma quadrilha qualquer de traficantes ou quando enfrentam os interesses de algum produtor rural que escraviza famílias inteiras, poderão contar com uma proteção mínima para si e seus familiares.

Querem a definição das regras de aposentadoria. Hoje, muitos magistrados não sabem quando se aposentarão e o quanto ganharão quando isso ocorrer.

E, também, querem a adoção de medidas que preservem sua saúde. Pesquisa realizada pela Anamatra indica, por exemplo, que 41,5% dos magistrados trabalhistas sofrem de depressão e que 50,9% são acometidos de insônia. A mesma pesquisa indicou que 64,3% dos juízes trabalham nas férias e 70,4%, nos finais de semana.

A sociedade concedeu garantias aos juízes para preservar a isenção dos julgamentos. Por causa destas garantias, um juiz não está sujeito à perda do cargo, à transferência do local de trabalho ou à redução salarial, podendo contrariar quaisquer interesses ao proferir a decisão que entende justa.

O silêncio dos poderes Legislativo e Executivo quanto às reivindicações da magistratura, inclusive na expressa recusa ao cumprimento da norma constitucional que determina a revisão anual do valor do salário (subsídio) dos juízes, é eloquente. Para alguns integrantes destes poderes, não há porque atender a qualquer pleito daqueles que contrariam os seus interesses.

Falar que juiz ganha bem e que deve parar de reclamar é fácil. O difícil é pensar e entender que este discurso interessa àquele que, numa sala de audiência, sempre se senta ao lado do excelente e caro advogado, algumas vezes pago com dinheiro público.

Daniel Souza de Nonohay

Juiz do Trabalho e secretário-geral da Amatra IV

Veiculo: Correio do Povo – 12/12/2011

Compartilhamento