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Caso Araceli. Quem ainda lembra?

Andréa Saint Pastous Nocchi – Juíza do Trabalho

Araceli Crespo tinha 8 anos e na tarde do dia 18 de maio de 1973 saiu mais cedo da escola, autorizada pela mãe que era viciada em cocaína e possivelmente traficante de drogas, para levar um envelope até um prédio no centro da cidade de Vitória, no Estado do Espírito Santo.
Ao encontrar os destinatários da encomenda, Araceli foi drogada, espancada, estuprada, e assassinada. Seu corpo permaneceu dias escondido em um freezer, desfigurado por um ácido corrosivo, até ser abandonado em um terreno e localizado, ironicamente, por uma criança que brincava no centro da cidade.
Os suspeitos de envolvimento no assassinato pertenciam a famílias importantes do Estado do Espírito Santo e eram conhecidos pelas festas que organizavam, onde drogas e violência sexual de menores eram as principais atrações.
Os assassinos jamais pagaram por seu crime brutal. Uma série de assassinatos, ocultação de provas, intimidação de testemunhas, além da conivência de pessoas influentes da sociedade capixaba, incluindo policiais, membros do judiciário e políticos ligados ao Governo Militar, fizeram prevalecer a impunidade.
O corpo da menina só foi enterrado três anos depois do assassinato, permanecendo numa fria gaveta de necrotério. A infância violentamente interrompida da menina capixaba revoltou, chocou e sensibilizou diversos segmentos da sociedade brasileira.
Durante algum tempo, o assunto tomou conta dos noticiários, mas o medo calou muitos e jamais se soube o que realmente aconteceu naquele dia. A morte de Araceli serviu de alerta para toda a sociedade brasileira, expondo a realidade de violências cometidas contra crianças. Pela brutalidade, a data do assassinato tornou-se um símbolo da luta contra essa violação de direitos humanos. Em 1998, por iniciativa de cerca de entidades públicas e privadas, reunidas na Bahia, foi instituído o dia 18 de Maio como o Dia Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual Infanto-Juvenil.
Em 2000 o projeto de lei que instituiu oficialmente o dia foi sancionado e, todos os anos, entidades governamentais e não-governamentais, e representantes da sociedade civil utilizam essa data para reflexões, debates e, especialmente, para avaliar e medir o nível de proteção das nossas crianças.
Não foi diferente neste 18 de Maio. Em todo o País houve mobilizações e análises das políticas públicas adotadas nas últimas décadas. A inexistência de dados estatísticos específicos impedem que se conheça a verdadeira dimensão do problema. A sombria peculiaridade de que a maioria deste tipo de crime são praticados por pessoas da família ou pessoas muito próximas, contribuiu para a dificuldade das denúncias e das ações efetivas de prevenção e punição. As políticas governamentais são ineficazes e a  eliminação do problema passa, necessariamente, pela erradicação do trabalho infantil com oportunidade de trabalho e emprego digno para os pais e pela qualificação da educação, de forma que a família, a escola e o poder público formem uma sólida base para o desenvolvimento da infância plena. Enfrentar a exploração sexual de menores para fins comerciais como uma temática do mundo do trabalho pode contribuir para o aumento dos sistemas de proteção por se tratar de uma das piores e mais degradantes formas de trabalho infantil, nos termos da Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho. Por isso, lembrar o Caso Araceli é manter viva a chama da indignação e da determinação que move, que mobiliza e que conscientiza. Vamos repetir a frase símbolo da campanha do 18 de Maio como se fosse um mantra transformador da realidade:
Esquecer é permitir. Lembrar é combater.

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