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Com a presença do Papa Francisco: magistrados da 4ª Região participam de cúpula sobre direitos sociais

Um grupo de magistrados do Trabalho da 4ª Região participou da Cumbre Panamericana de Direitos Sociais e Doutrina Franciscana, encontro realizado em Roma, na Itália, nos dias 3 e 4 de junho. O seminário foi promovido pela Pontifícia Academia das Ciências Sociais do Vaticano e reuniu operadores do Direito do países da América do Norte, do Centro e do Sul.

O evento contou com a participação dos seguintes magistrados do Tribunal do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS): desembargadora Maria Madalena Telesca (pela Associação Latinoamericana de Juízes do Trabalho – ALJT) e juíza Valdete Souto Severo (pela Associação Juízes para a Democracia – AJD), ambas presentes como observadoras.

Já os juízes Eliane Covolo Melgarejo (representante do TRT-RS), Rafael da Silva Marques (participante pelo TRT-RS), Daniela Floss e Gabriela Lenz Lacerda (ambas pela AJD) participaram na qualidade de expositores. 

Leia nos links as manifestações dos quatro magistrados. 

ELIANE MELGAREJO

RAFAEL MARQUES 

DANIELA FLOSS

GABRIELA LENZ DE LACERDA

Mensagem do Papa Francisco

No encerramento do encontro, o Papa Francisco falou aos participantes. Em sua mensagem, ele salientou a importância de lideranças “valentes” capazes de abrir caminhos às gerações atuais, e também futuras, criando condições para superar as dinâmicas de exclusão e segregação, de modo que a injustiça não tenha a última palavra.

Francisco também manifestou a sua preocupação com alguns “doutrinários”, que consideram os direitos sociais como algo antigo e, deste modo, confirmam políticas econômicas e sociais que levam à aceitação e justificação da desigualdade e da indignidade. Desta forma, cria-se uma “injustiça social naturalizada”.

Para o Papa, um sistema político-econômico precisa garantir que a democracia não seja somente nominal, mas seja marcada por ações concretas que velem pela dignidade de todos os seus habitantes. Isso exige esforços por parte das autoridades para reduzir a distância entre o reconhecimento jurídico e a prática do mesmo. “Não existe democracia com fome, desenvolvimento com pobreza nem justiça com iniquidade”, ponderou.

O Pontífice ainda declarou-se preocupado com uma nova forma de intervenção exógena nos cenários políticos dos países através do uso indevido de procedimentos legais e tipificações judiciais, prática conhecida como “lawfare”, e com o isolamento dos juízes. Por isso, aprova uma das finalidades do encontro no Vaticano, que é criar um Comitê Permanente Pan-americano de Juízes e Juízas pelos Direitos Sociais.

No término da exposição, Francisco concluiu: “Estimados magistrados, vocês têm um papel essencial, são também poetas sociais quando não têm medo de ser ‘protagonistas na transformação do sistema judicial baseado no valor, na justiça e na primazia da dignidade da pessoa humana’ sobre qualquer outro tipo de interesse ou justificação. ”

Leia, a seguir, a análise da diretora de Assuntos da Cidadania da AMATRA IV, juíza do Trabalho Gabriela Lenz de Lacerda, a respeito do encontro. 

“Estamos na beira do mundo, na beira de nós.

Aqui no fundo o grito é rouco, mas ainda é voz.

Ninguém solta a mão de ninguém.

Ninguém solta a mão de ninguém.”

A Cumbre Panamericana de Direitos Sociais e Doutrina Franciscana não foi um simples encontro de juízes preocupados com justiça social. Foi um dar as mãos. Foi olhar em volta e me ver cercada de tanto/as companheiro/as que eu admiro por sua coragem, comprometimento e empenho na construção de um mundo mais justo e igualitário. Foi olhar para dentro de mim e encontrar outro/as tanto/as companheiro/as que eu trago comigo porque, nas nossas relações de afeto, passaram a formar as minhas melhores partes. Foi olhar para alguns dos rostos desconhecidos que ocupavam os espaços ao meu redor e perceber que, sem qualquer combinação prévia, estavam caminhando na mesma direção. A Cumbre foi uma curva que fez com que as nossas trajetórias paralelas se encontrassem e se enredassem. Foi um vendaval de esperança no meio desse mundo adoecido.

O argentino Papa Francisco nos mostra como as veias abertas da nossa América Latina constrói subjetividades ricas e com um imenso potencial de transformação. Não poderia ter sido outro líder a reunir em uma mesma sala pessoas que, quando assumiram seus cargos de poder, passaram a fazer uso do privilégio social que têm para ecoar as vozes de outras tantas pessoas que não são ouvidas. Porque assumem a responsabilidade pelo estado de coisas que estamos vivendo. Porque sentem a dor do Outro como se sua fosse. E sabem que não seremos felizes em um mundo tão desigual, onde os direitos humanos são garantidos para uma fatia muito pequena da população.

Na sua fala, Papa Francisco demonstrou preocupação com o tempo de crise que estamos vivendo, cada vez mais a afastar a justiça social. Também condenou o uso indevido do Poder Judiciário com a prática de lawfare que, “além de colocar em sério risco a democracia dos países, geralmente é utilizado para minar os processos políticos emergentes e propor a violação sistemática dos direitos sociais”, pontuando que “para garantir a qualidade institucional dos Estados é fundamental detectar e neutralizar esse tipo de práticas que resultam da imprópria atividade judicial em combinação com operações multimidiáticas paralelas“. Lembrou, por fim, que os juízes e juízas são “poetas sociais quando não têm medo de “serem protagonistas na transformação do sistema judicial, baseado na coragem, na justiça e na primazia da dignidade da pessoa humana”[3] sobre qualquer outro tipo de interesse ou justificativa” (http://www.ihu.unisinos.br/589824-nao-ha-democracia-com-fome-nem-desenvolvimento-com-pobreza-nem-justica-na-desigualdade-afirma-papa-francisco)

Mais do que por sua fala, pelas suas ações, o Papa Francisco me fez recuperar a fé. Não em um Deus que tem sido utilizado para justificar as injustiças, acomodando seus fiéis e impondo padrões sociais que impedem a manifestação da riqueza humana. Me fez recuperar a fé nessa força que vive dentro de nós – de natureza humana ou divina, quem sabe – a nos mostrar que fazemos parte de uma coletividade muito maior do que as nossas individualidades. Então, nesse momento em que “estamos na beira do mundo, na beira de nós”, em uma lógica neoliberal que está destruindo os direitos sociais para privilegiar uma minoria, Papa Francisco nos lembra que o caminho é não soltarmos as mãos uns dos outros. Vamos junto/as! Somos multidão!

Participaram do encontro as Juízas Valdete Souto Severo, Gabriela Lenz de Lacerda, Daniela Floss, representantes da Associação dos Juízes para a Democracia – AJD); Eliane Covolo Melgarejo e Rafael da Silva Marques, representantes do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região; e a desembargadora Maria Madalena Telesca, representante da Asociación Latinoamericana de Jueces del Trabajo – ALJT). Todo/as os participantes são associado/as da Associação dos Juízes para a Democracia – AJD e da Associação dos Magistrados do Trabalho da 4ª Região – AMATRA IV. A Juíza Federal Ana Inês Algorta Latorre, do TRF4 e também associada da AJD, foi escolhida para integrar o Comitê Permanente Pan-Americano de Juízes e Juízas pelos Direitos Sociais. A íntegra do evento pode ser acessada em: https://www.youtube.com/watch?v=dzzcMecEjFY e a íntegra dos discursos dos juízes pode ser acessada em: https://drive.google.com/drive/folders/1ZW5QtKE_tVxoVfBRHVY4XKtLi4-FiZ0U

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