ROMPENDO O PACTO DO SILÊNCIO
Adriana Kunrath, Rachel Mello, Luciana Kruse
Uma das tantas coisas que a pandemia desvelou foi a grande desigualdade entre mulheres e homens quanto às atividades domésticas e cuidados em geral com filhos e familiares. As mulheres são as mais sobrecarregadas e as que mais se ativam nas tarefas domésticas e de cuidado. A estimativa é que as mulheres gastem 10 horas a mais do que os homens nas tarefas domésticas por semana (pesquisa IBGE/2020). Claro que há as honrosas exceções, mas, por ora, estão a confirmar a regra.
Mulheres amamentando em frente às câmeras de seus notebooks durante reuniões de trabalho, cancelamentos de compromissos profissionais por absoluta impossibilidade de conciliar casa, filhos e outras tarefas de cuidado. A pandemia revelou situações que antes estavam escondidas e que, por total desinteresse da máquina produtiva, jamais vieram à tona. Podemos debatê-las, acompanhar lives tratando do assunto, mas com a condição de que as mulheres continuem dando conta de cuidar da casa, dos filhos, da família, do trabalho. Falem, discutam, desde que continuem produzindo, cuidando, limpando e organizando. Não rompam o pacto do silêncio!
Não fosse isso, apesar de, em muitos lares brasileiros, as mulheres serem o arrimo de família (45% em 2015, dados IPEA), elas recebem 77,7% do salário pago aos homens (pesquisa IBGE março/2021).
O isolamento social e o confinamento adotados como medida de saúde para o enfrentamento da covid-19 elevou a tensão, ocasionando um aumento de 50% nos casos de violência doméstica em face das mulheres no Brasil (artigo publicado em www.sejus.df.gov.br). E aqui o pacto do silêncio é ainda mais cruel, porque como “em briga de marido e mulher ninguém mete a colher”, muitas mulheres acabam assassinadas pelos companheiros.
Nesse 08 de março de 2022, porém, queremos romper o pacto de silêncio, assim como fizeram as mulheres no início do século XX, nos Estados Unidos e na Europa, ao tomarem às ruas em protestos por condições dignas de trabalho.
Romper o silêncio não é “mi-mi-mi”. Romper o silêncio é reconhecer as situações de desigualdade, discriminação e violência que as mulheres vivenciam ao longo dos anos no ambiente familiar e social; é discutir e implementar políticas que efetivamente promovam a igualdade e coíbam a violência em razão do gênero.
No âmbito do Poder Judiciário, foi lançado pelo CNJ, em outubro de 2021, o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero, cujo objetivo é guiar juízas e juízes dos diversos ramos da Justiça, para que realizem o direito à igualdade e à não discriminação de todas as pessoas, de sorte que, no exercício da jurisdição, não promovam a repetição de estereótipos, tampouco a perpetuação de diferenças, rompendo assim com culturas de discriminação, preconceitos e violência.
Nós, mulheres, esperamos que o protocolo se torne um poderoso instrumento de transformação social. Chega de violência! Chega de discriminação! Chega de preconceitos! Precisamos falar de gênero. Precisamos romper o silêncio.